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Este blogue é um espaço onde tento conjugar a divulgação do meu trabalho de pintura, através das publicações abertas a comentários, e a publicação de outras matérias na coluna lateral e nesta zona, ao alto da coluna principal.


Os assunto e conteúdos que aqui coloco, em paralelo com a pintura que faço, relacionam-se com as minhas opiniões e opções no exercício do acto de viver. Isso, como tudo, resulta de um compromisso entre livre-arbítrio e determinismo, de racionalismo e sensibilidade, de consciência e intuição, de ponderação e impulso.


Não será possível resumir neste espaço o meu pensamento acerca do mundo actual e do que é indispensável alterar para viabilizar um futuro, em que a nossa espécie assegure a sobrevivência da vida como a conhecemos, de uma forma que respeite a sua organização estrutural. Penso que em qualquer de nós tudo existe. A capacidade para fazer num sentido e no seu oposto. Cada um tem os seus conceitos de bem e de mal, se bem que há tendências mais universais. Para mim basta-me considerar por bem o que estabiliza, harmoniza, promove prazer e bem-estar, respeita e aceita e se constrói permanentemente na consciência da pertença a uma unidade global. A consciência do mal estará no extremo oposto. É uma forma simplista e não mais que um recurso para estabelecermos regras de conduta, para assumirmos a responsabilidade que os nossos recursos desmedidos para interferir no meio em que vivemos, nos confere.


A falta de um sistema político adequado para a gestão das sociedades que promova um papel social, de cada um, devidamente equilibrado no deve e haver, estabelecido no respeito sagrado pela dignidade de cada pessoa, é um sintoma de um mal que se avalia pelo exame da nossa História Universal. Se avaliarmos os registos da história política, das artes e do pensamento, verificamos que há um padrão de comportamento humano que é inerente à sua condição e que não tem mudado ao longo dos milénios. Depois vemos que tudo se repete, em ciclos. E verificamos que a velocidade das transformações evolui exponencialmente, porque tudo é um pulsar. A explosões sucedem-se retracções.


Neste momento não sabemos em que ponto estamos, mas sabemos que se não alterarmos o nosso comportamento, estaremos a construir uma destruição num apocalipse de dor e sofrimento em que a nossa arrogante inteligência fará a afirmação de ser a mais negra estupidez do Universo conhecido.




ASSINE PELA ABOLIÇÃO GLOBAL DA PENA DE MORTE

BASTA A POSSIBILIDADE DE INOCENTES SEREM CONDENADOS À MORTE PARA A ABOLIÇÃO SER IMPERATIVA


No passado dia 10 de Outubro foi o Dia Mundial pela Abolição da Pena de Morte. Duas semanas antes, a 25 de Setembro, o Brasil tinha-se tornado o 72º país a abolir a Pena de Morte do seu sistema penal, sem possibilidade de retrocesso.


Este é, ainda hoje, um tema polémico. Confrontados com a violência que espreita a esquina do quotidiano da pessoa mais serena e pacífica, e com a consciência que a divulgação mediática que existe dessa mesma violência muitos são os que apesar da sua boa personalidade cívica e humana, hesitam ou, nem por isso, antes apoiam a pena de morte como solução para conter e castigar os crimes que atingem inocentes.


Pessoalmente, expresso aqui uma opinião que assume uma série de implicações, pelo que não quero fazê-lo, sem fundamentar a minha posição e assumir a consciência desses fundamentos. Estou consciente do privilégio que representa nunca ter sido alvo de episódios de relevante violência. Consigo, talvez por defeito, mas quanto baste para entender o estado de espírito de quem sofreu sérias circunstâncias
de ofensas pesadas à sua integridade física, atentados ou até assassínios dos que lhe são próximos.Há casos e circunstâncias em que os ofendidos poderão encontrar argumentações que sustentem uma execução num caso específico. Há até casos de assassinos que querem morrer. Há muitos que até se suicidam no corredor da morte, seja pela incapacidade de lidar com a culpa ou com a desumanidade da tortura da espera. No entanto, há uma coisa de que todos temos de estar conscientes. Num determinado sistema penal há ou não há pena de morte. E temos de estar conscientes de uma outra coisa. Nenhuma lei que exista em qualquer país, para qualquer efeito, tem garantia de ser sempre exemplarmente aplicada. Os casos são julgados por pessoas e por elas são aplicadas as penas. As pessoas detêm poderes e têm interesses que, por vezes são difíceis de identificar até para os próprios porque estão nas esferas obscuras das ideologias e das afectações de carácter e que são determinantes nas decisões. Pesa, para mais, que a maioria dos locais onde a pena de morte ainda é aplicada, e onde é necessário que seja abolida, são aqueles onde os atropelos à isenta aplicação da lei são mais fáceis.


Não é defensável que estejamos vulneráveis à violência social. Sabemos que há seres humanos cuja monstruosidade de comportamento alimenta as vendas e audiências dos meios de comunicação com a evidência de que não terão a mínima viabilidade de recuperação. No entanto, defendo que as sociedades terão de encontrar métodos de prevenção e de regulação destes fenómenos que estão completamente associados à própria natureza humana e à forma como se gerem políticamente as sociedades. Acredito que um eficaz combate à miséria existencial e um sistema de educação humano e adequado resolverá uma grande parte do problema. A aplicação rigorosa dos direitos humanos, já reconhecidos, outra parte. Só que o que poderia ser fácil, não o é, e esse estado, demorará a ser atingido, se algum dia o for à escala global. Até lá, os crimes e as agressões continuarão. E a necessidade de lidar com eles, sem passar pela eliminação física do criminoso. Porque basta a possibilidade, em aberto, de um inocente condenado para inviabilizar que se possa manter uma lei que o permita. Nos Estados Unidos, onde ainda existe, como sabem, pena de morte nalguns estados, já se tem descoberto inocência, e conduzido à libertação de presos, numa espera que chega a durar 20 anos.


Perante estes factos só é possível defender a abolição da pena de morte, sem excepção do local geográfico, da natureza dos crimes, das características do criminoso ou do método de execução utilizado. É um princípio e um conceito a eliminar para atingir um mundo melhor.


Como nota final, registo o facto agradável de Portugal ter sido a vanguarda da abolição da Pena de Morte. Foi introduzida pela Reforma Penal de 1867, tornando-nos no primeiro país a aprovar uma lei desta natureza. Notável, para um país, em que em 1476, os registos reais dão conta daquilo a que chamam "uma lei mais humana" referente à decisão de D.Afonso V de proferir uma sentença em que só o marido podia matar a mulher culpada de crime de fugir ao marido, pecando-lhe na lei do casamento.


ATENÇÃO - ESTE VÍDEO MOSTRA A CRUELDADE HUMANA PARA COM OS ANIMAIS

Nos dias de hoje, só a ganância do lucro, o desprezo pelo sofrimento alheio e a crueldade para com as outras formas de vida, explicam as experiências com animais em laboratório, para fins médicos, cosméticos ou outros. No total alheamento pela dignidade da vida e pelo seu carácter sagrado, animais dotados de consciência e sensibilidade elevadas são torturados com objectivos militares e científicos, por vezes durante anos a fio, passando existências inclassificáveis. A engenharia genética que tem sido, tantas vezes, usada em más direcções, providencia afinal os meios que permitem avançar a medicina sem o uso deste tipo de práticas, mas elas continuam a ser usadas.
Impõe-se que todos os que temos consciência do mal no exercício destas práticas cruéis e que com elas não queremos pactuar, nos informemos, de quais as empresas que comercializam produtos ou medicamentos resultantes destas experiências. Felizmente o mercado actual dá alternativas para se evitar um consumo que suporte essas actividades.

NÃO À SENTENÇA DE MORTE - Não deixe o seu cão velho na rua, nas noites frias!

Chained Dogs

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Se tiver dificuldades com a língua inglesa faça uso da ferramenta de tradução do Google. Não é perfeita, mas permite-lhe ter uma ideia muito aproximada dos conteúdos.

MOSTRA VIRTUAL DE PINTURA

sábado, 26 de setembro de 2009

AO OLHAR PARA NÓS

Não foi, certamente essa a razão, mas poderia ter sido. O senhor macaco-rhesus ou resu que foi o modelo para a fotografia de base a este retrato, poderia ter olhado para os humanos em frente dele, e em face dos comportamentos exibidos, ter tido esta reacção.



Decidi fazer este retrato para abrir um espaço de reflexão sobre o indíviduo, a sua relação connosco e a forma como dele nos aproveitamos e o exploramos. Com todo o carinho e respeito o incluo nesta galeria de pinturas, para o evocar, sem o perturbar, pese o uso do original que para isso serviu. Sem críticas que não sejam equilibradas pelo apreço ao trabalho, pois que se assim não fosse não tinha havido lugar a esta publicação.




Mac Totalweb
Reso surpreendido
Pastel seco sobre papel negro
50x65cm - 2009




Macaco-rhesus ou reso (Macaca mulatta)
Este macaco é um primata que tem o seu habitat nas florestas da China, Afeganistão e Índia.
Com uma altura média de 50/60 cm, pesa à volta de 13 Kg. É omnívoro e tem uma gestação à volta de seis meses de que resulta uma única cria, muito dependente dos cuidados maternos nos primeiros tempos de crescimento. Vivem em grupos sociais de mais ou menos duas dúzias de indivíduos, de ambos os sexos, e têm uma longevidade até 30 anos. Tem a particularidade de ser um excelente nadador.

Detalhe triste: É uma escolha preferencial para estudos e experiências laboratoriais. Por exemplo, o factor Rh do sangue foi demonstrado, pela primeira vez, num macaco destes.







Mac Detalho dois web




Fiz este retrato, inspirado no conteúdo de um livro da fotógrafa norte-americana Jill Greenberg. Com uma carreira na fotografia de moda encontrou-se, por via da produção de um anúncio, em face de uma macaca para fotografar. Impressionada pela inteligência da modelo e pelas expressões e emoções humanas demonstradas, a fotógrafa decidiu fotografar o animal para além do objectivo do anúncio. Foi o início de um projecto de cinco anos, durante os quais fotografou trinta macacos de diversas espécies.




Página web de Jill Greenberg:





Ver na coluna lateral, no espaço de fotografia, o vídeo dedicado a este trabalho fotográfico e no espaço de leituras a informação relacionada com o livro.



O projecto deu lugar a uma exposição das fotografias numa galeria de Los Angeles. Um dos presentes, realizador de cinema, fez um comentário ao evento, donde extraio a seguinte passagem:


“ fui à exposição porque a foto do convite me atraíu. Tive a surpresa de me cruzar com muitos conhecidos, que não via há muitos anos. Conforme entravam no espaço da exposição, com um copo de vinho tinto na mão, fui invadido por um sentimento de mal-estar e opressão.  Essas pessoas pareciam, como sempre, simpáticas e inteligentes, mas  lembravam-me um tipo triste e bizarro que eu conhecera: eu próprio. Era o melhor estado de espírito para observar as fotografias de macacos de Jill.
…as fotografias fizeram-se no espelho da minha própria confusão. Há um nível em que somos visivelmente homens, e outro em que a nossa evolução na vida e a nossa caminhada em direcção à morte contrariam todas as nossas tentativas para sermos seres humanos decentes.
Estas fotografias têm um sentido e são desprovidas. São sublimes e ridículas. Revelam exploração dos modelos e respeito. São cómicas e tristes. Agradam-me muito.”
                                                                                                                                                                                                                                                 Paul Weitz






Mac Detalho um web





“As expressões de Katie (a primeira macaca fotografada, por acaso, para o anúncio) eram muito humanas e a sua inteligência saltava aos olhos. Percebi que tinha encontrado um novo tema, ideal para um estudo sociológico. Depois de começar este trabalho, em Outubro de 2001, logo após os acontecimentos trágicos de 11 de Setembro, descobri em mim uma consciência sociopolítica. A interpretação das atitudes destes animais pode-se aproximar à do comportamento dos seus primos próximos.”
                                                                                                                                                                                                                                            Jill Greenberg





Com as minhas lembranças e evocações das leituras de Desmond Morris, no final da minha adolescência, deixo mais uma homenagem sentida a estes seres que respeito afectuosamente.



sexta-feira, 18 de setembro de 2009

AMARELO – O PEQUENO TIGRE



Mantendo-se as circunstâncias que condicionam a minha actividade de pintura, continuo com os meus “exercícios” a pastel sobre papel. Tenho um objectivo definido, que a seu tempo revelarei, ao fazer a presente série de animais domésticos. No entanto, as pinturas que tenho apresentado nas últimas semanas, não são representativas do meu trabalho nesta área, sobretudo a nível conceptual. A quem o quiser conhecer convido a visitar os arquivos de Junho e Julho deste blogue.

Satisfazendo as expectativas dos visitantes regulares, segue mais um membro de quatro patas desta nossa família. O gato Amarelo.



Amarelo total web
Amarelo
Pastel seco sobre papel negro
50x65cm – 2009



O Amarelo é um pequeno tigre. Tem a envergadura e o peso (mais de 7Kg) do cão Tintin. Foi o último elemento a entrar para o nosso lar.



Entrou por iniciativa própria. Há cerca de dois anos, durante um período, usei como atelier de pintura um armazém de alfaias agrícolas num espaço contíguo à casa que habitamos. Como eu gostava de pintar com o grande portão do armazém completamente aberto para beneficiar da luz natural, o nosso amigo começou a visitar-me para observar o “ambiente” e avaliar o potencial de conveniência. Ou talvez, simplesmente, por pura curiosidade para justificar a fama dos gatos. Ora o escriba destas linhas, em face deste visitante, que vinha por momentos “colorir” o espaço em que as cores se misturavam para dar vida ao conteúdo das janelas de tela, cumprimentava-o amistosamente, de início. Em dada altura, suspeitando da sua fome, dei-lhe um pouco de comida da gata Mila. E assim começou uma relação afectuosa com um felino de comportamento muito decidido e firme no gesto. Quer dizer no uso das unhas e dos dentes em qualquer circunstância em que o seu livre-arbitrio ou dignidade sejam, no seu recto entender, postos em causa. De facto, se por vezes, faz algumas cedências neste aspecto, reconheço que só a mim me dá o privilégio. É, nesse aspecto, completamente diferente da gata Mila. Senhor do seu nariz com os humanos conhecidos, esquivo e agressivo com os desconhecidos e brigão com os outros gatos, protagonizando escaramuças patentes nalgumas cicatrizes que exibe como medalhas, é de facto um pequeno tigre.



Apesar de ser, segundo opinião veterinária, um animal ainda jovem, já passou por um episódio grave de saúde. Já o deixámos internado, quase sem esperança de o reencontrarmos vivo no dia seguinte. Foi uma retenção urinária, que já lhe tinha elevado os níveis de ureia ao ponto de lhe ameaçar as funções vitais. Felizmente sobreviveu, mas desde aí, só pode comer rações específicas para gatos com deficiência renal, que, pelos vistos, abundam.



De qualquer forma, quero realçar, que é um animal que, sem prejuízo, do seu porte altivo e gesto rápido na correcção de alguma ofensa, está sempre disponível para um afecto e demonstra, para comigo, uma amizade especial.



Realço o seguinte episódio. No tal armazém, que como disse está implantado num terreno rural, abundam em dias de temperatura elevada ou moderada pequenas lagartixas, que satisfazem, muito competentemente, os seus instintos de caçador. Instintos esses que já tem provado possuir com alguma competência técnica, dado conseguir até apanhar pequenos pássaros em voo. Ora como eu tenho o instinto oposto, ou seja de preservar a vida a todo o custo, faço sempre que posso, a grande contrariedade de lhe retirar as presas enquanto estão vivas, devolvendo-as aos seus espaços. Como já disse, a mim ele ainda vai consentindo esses desaforos. Ora nos tempos do armazém, eu fiz isso diversas vezes com as lagartixas. Então o nosso amigo amarelo, que pernoitava (e ainda hoje pernoita) no armazém brindava-me frequentemente, com lagartixas mortas junto do meu banco de pintura, pela manhã. Por vezes se as caçava enquanto eu estava distraído a pintar ia levá-las para o pé de mim. Do seu ponto de vista, quando eu lhas retirava, queria-as para mim, logo ele vinha dá-las de presente.




Amarelo detalhe web


“Mago respirou fundo. Abriu o nariz e encheu o peito de ar ou de luar, não podia saber ao certo, porque a noite era uma mistura de brisa e claridade. Mas fosse de frescura ou de luz a onda que bebera dum trago, de tal modo o inundou, que em todo o corpo lhe correu logo um frémito de vida nova. Esticou-se então por inteiro, firmado nas quatro patas, arqueou o lombo, e deixou-se ficar assim alguns instantes, só músculos, tendões e nervos, com os ossos a ranger de cabo a rabo. Arre que não podia mais! Aquele mormaço da sala dava cabo dele.”
                                                                                                               Miguel Torga, in “Os Bichos”




O Mago era um gato que trocara a dignidade do exercício felino, livre e vadio pelas mordomias da vida de animal de estimação.


Pois, penso eu, com a natural satisfação que este Amarelo tem o melhor dos dois mundos. Todos os dias uma dose de exploração vadia à sua vontade, comida sempre certa, veterinário quando precisa, desinfestação de parasitas e um tecto para pernoitar. Mais, um enorme armazém por sua conta, onde conhece todos os cantos, e tem até um abastecimento regular de lagartixas e um ratito do campo uma vez por outra. Dos nossos bichos o que melhor se assume como uma fera doméstica.








quinta-feira, 10 de setembro de 2009

TINTIN - O VELHO AMIGO

Novo pastel, que é o retrato de um velho amigo, antes, muito antes de ser um dos elementos da parte da família que é constituída pelos animais de companhia. A galeria ainda tem espaço para mais um e se for alargada ao galinheiro, pelo menos ainda dará lugar aos membros mais destacados, o galo Cristóvão e a galinha Sesaltina, fundadores da colónia.

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Tintin
Pastel seco sobre papel negro
50x65cm - 2009

O cão Tintin é o companheiro e amigo cuja estória não cabe no espaço de um post. A sua história envolve-se na minha história dos últimos 14 anos. Olhando para trás, parece uma vida inteira, de várias décadas, comprimida num espaço mais curto.

O Tintin é um pequeno rafeiro que, segundo opinião veterinária, será o produto de cruzamento entre um “teckel”, vulgarmente conhecido por “salsicha” ou “baixote” e um podengo ou animal morfologicamente próximo. É a estória clássica do animal que foi recolhido da rua, após um período de abandono e infortúnio, em que o seu estado, no momento em que o encontrei, deixava adivinhar ter comido “o pão que o diabo amassou”, extraído de contentores de lixo e aí, eventualmente, disputado com outros cães, companheiros de estrada.



Nas viagens de montanha russa que tem sido o caminho percorrido desde esse ano de 1995, na partilha da existência, desenvolvemos um entendimento que ultrapassa as dificuldades colocadas pelos desajustes dos modos de expressão e das barreiras da espécie. 14 anos passados, turbulências diversas “surfadas” como se vagas alterosas fossem, enfrentadas sem recurso a qualquer prancha, encontramo-nos hoje com um olhar recíproco que, penso, se poder resumir dizendo que eu vejo o meu amigo Tintin, como um cão humanizado e que penso ter razões para crer que ele me vê como um cão grande, com algumas dificuldades de entendimento que me impedem de perceber, de forma capaz, os seus esforços de comunicar. Além disso, a seus olhos, terei um elevadíssimo défice no sentido do faro. No entanto, a amizade sempre fiel e o entendimento de mim como uma espécie de alter-ego demonstra-se pelo facto de se ter tornado numa sombra que sempre desliza junto com o meu andar. Também pelo vocabulário de silvos e gemidos com que tenta aproximar-se da linguagem humana, o que não resulta muito bem e, por vezes, não é muito fácil de suportar por períodos longos.



Há alguns anos, passou por um perigoso problema de saúde, que implicou uma cirurgia e resultou num diagnóstico que não deixava grande esperança de vida tão longa, mas o destino tem sido generoso, e presto-lhe homenagem e agradecimento  por isso e, antecipadamente, pela continuação desta benção.

Como já teria perto de um ano quando o recolhi, terá agora 15 anos ou um pouco mais. Está velhote. Ficou grisalho e está consideravelmente surdo. Está mais sensível a todos os níveis, mas continua a fazer, alegremente, dois grandes passeios diários. Por outro lado, como nos integrámos há mais de três anos na família que agora somos, tem 3 companheiros humanos que o estimam, e dois gatos com que tem uma relação cordial com estáveis acordos de não agressão. Respeitando, aliás, alguns centímetros de distância, o convívio é harmonioso e sereno, por vezes até claramente desejado. A gata Mila gosta dele e respeita-o. O Amarelo trata-o melhor que aos outros gatos.



No inverno passado um velho rafeiro, também de pequeno porte, que vivia com vizinhos próximos, deixou-nos para encetar o seu caminho para a Natureza pura, para se integrar no pó das estrelas. Tinha, dizem, 21 anos. Espero que o Deus dele tenha a mesma medida para este companheiro.

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“O som da água diz o que eu penso.”
Lao Tzu


“Se o viajante encontrar um companheiro virtuoso e sábio, deve segui-lo alegremente e vencer os perigos do caminho”
Buda

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

MILA, A FELINA QUE ESCONDE UMA ALMA SERENA

Em face de um quase forçado prolongamento do período entre projectos mais exigentes de pintura, dado que as necessidades de produção do próximo o estão a atrasar consideravelmente, continuo a fazer trabalhos em pastel, um pouco ao sabor da vontade do momento. Se tivesse previsto tanto tempo de paragem e podido avaliar que a colecção de experiências em pastel seria tão numerosa, teria criado um conjunto de trabalhos mais coerente, mas como “se” é uma das palavras mais perturbadoras da nossa língua, há que tratá-la com a delicadeza que exige e aceitar serenamente a circunstância.

Desta vez decidi fazer um retrato de um dos animais cá de casa, de um dos nossos companheiros e amigos de quatro patas. A gata Mila.


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Mila

Pastel seco sobre papel negro

50x65cm – 2009


A Mila, como todos os três animais que nos dão o privilégio da sua companhia e amizade, entraram para a família saídos de um tempo de infortúnio. Apesar do seu “pedigree” persa e do seu ar imponente, quando a descobrimos vivia numa coelheira, padecendo de maleitas diversas. Acreditamos que era uma situação limite, mesmo sendo difícil avaliar os limites destas situações.

A Mila sempre nos impressionou com o seu ar altivo e poderoso, mesmo ao fim de prolongado cativeiro. Miava de forma pouco estridente mas autoritária. Na verdade, revelou-se no trato connosco, um animal paciente e afectuoso, totalmente desprovido de agressividade, ultrapassando, de longe e pela positiva, todas as experiências que já tive com gatos. As aparências iludem, nos humanos como noutras espécies. Ou talvez nem tanto. Com outros animais, a Mila é enérgica e corajosa impondo respeito a gatos de maior porte e até a cães pequenos. A lógica sempre existe, mas nem sempre é transparente.


Uma nota final para referir que, actualmente, a Mila exibe uma pelagem mais modesta, porque devido a uma combinação de circunstâncias infelizes foi forçada, há cerca de um ano, a fazer uma tosquia e o pêlo ainda não recuperou totalmente. Tudo o resto se mantém inalterável.


Mila detalhe web


“É maravilhoso encontrar um paradoxo. Em face dele temos esperança de progredir.”
Niels Bohr

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