Todos os Bebés são divinos. O seu estado sem a mácula da consciência do Bem e do Mal é uma das essências do Sagrado Mistério. Nem todas as Mães são igualmente divinas porque por elas já se estende essa consciência. Mas todas, sem excepção, onde brilha o amor que alimenta o acto de gerar e a inevitável angústia generosa de entregar ao Mundo o Filho que lhes sai desse Santo Graal que é o seu útero, estão nos momentos do exercício desse Amor pleno, em estado de Graça. Em comunhão com o Mistério. Em estado puro, que é o mais raro da existência contaminada que vivemos.
Todos nós (eu que escrevo e vocês que lêem) já assim fomos. Bebés. Puros, vivemos antes da estória do pecado original, entenda-o cada um como quiser. Tínhamos a capacidade de olhar o Mundo à nossa volta com um olhar limpo e disponível. Depois fomos inevitavelmente dados ao mundo. Iniciámos o nosso caminho. Fomos “educados”, integrados e “cultivados”.
Se por ventura, na voragem da passagem do tempo e da vida, não perdemos a capacidade de nos interrogarmos, o desejo de nos conhecermos e a capacidade de falar com o Mistério, de rezar sem fórmulas, então damos connosco com a vida consumida e à procura da mesma pureza inicial do tempo de bebés.
Dessa capacidade de olhar o horizonte ou o objecto mais perto de nós da mesma forma, sem o racionalizar, julgar ou criticar. Sem lhe chamar um nome sequer. Apenas vivendo a sua essência. O Nirvana a que aspiram velhos monges após vidas de meditação nos mais altos cumes do Mundo. Afinal o que está alcance de qualquer gato do telhado quando, sem qualquer interesse específico, olha para lá de tudo o que vê.
Olhando o caminho
Pastel seco e acrílico sobre papel
40x60cm – 2009
Olho o caminho à minha frente
assim como uma linha de caminho de ferro
mas sem ferro nem linha
só de terra, de terra quente,
quente de ardida num fogo eterno
a que estou prometida
para a vida, a tua e a minha,
meu Filho, nessa linha que oscila
entre o Céu e o Inferno.
Desde que iniciei “O canto da Fénix” o espaço que decorreu desde o último post até agora foi o mais longo período de silêncio que aconteceu neste blogue. A conjugação de diversos acontecimentos, previstos uns, outros não, criaram um contexto de ocupação de tempo e de desgaste de disponibilidade mental e de energia estrutural que não me deixaram possibilidades de preparar materiais para por cá publicar. Como alguns terão notado, mesmo os tempos para responder aos comentários do último post, foram fugidios e esparsos, pelo que ao contrário do habitual foram sendo respondidos ao longo do tempo em vez de serem de uma só vez.
Pelo meio, também só pintei esta Mãe que oferece o seu filho à Vida, ao Mistério, à voragem dos Desígnios da humanidade tortuosa e torturada. Para todos os que assim quiserem será uma Madona com um Cristo bebé. Para os que preferirem será a Sagrada Imagem da Maternidade comum dando o seu Filho, tão incógnito e concreto como qualquer de nós e dos nossos filhos ao Navio em que todos navegamos no mar do desconhecido.